(Mesmo que as palavras sejam tristes não faltará em mim um sorriso para amar com saudade)
DAMIEN RICE- ELEPHANT
As saudades...já ouvi tantas vezes a palavra SAUDADE dita em mil bocas, mas agora que a sinto acho que nunca ouvi ninguém dizer a verdade... Todos falam deste sentimento mas hoje sinto que nunca ninguém o sentiu realmente. Agora que penso na solidão do meu quarto sinto-me no direito de afirmar que a saudade é só minha...foi uma palavra inventada por mim! Existem belas poesias...melancólicas e tristes grávidas de lamentos contando histórias de amores que partiram chorados à beira mar acenando um adeus qualquer... não lhes conhecemos os rostos... sim, porque as saudades têm rosto só que os poetas não o dizem porque recordar fá-los sofrer . Então falam de almas que vivem espetadas no seu peito como se sombras se tratassem e que ferem na escuridão...não lhe dão nome...não lhe descrevem os traços...a alma não se vê por isso talvez se sinta menos que a falta de um rosto bem delineado.
Depois a saudade é um sentimento sem cor nem cheiro mas que se sente... também já ouvi dizer. Mas se eu dissesse que a saudade é negra como a noite e cheira a solidão, acham que estaria a mentir? Porque é assim que eu a pinto nos meus olhos... com um rosto negro sujo de cinzas de olhar sombrio e sorriso desmaiado nuns lábios brancos sem brilhos a adornar. Vejo-a nua e sem pudor da sua nudez imagino-a a dançar num palco iluminado para toda a gente apreciar a sua beleza erudita. Ouço as palmas descrevendo a admiração dos mortais perante a sua graciosidade e delicadeza no ferir... uma verdadeira rainha, majestosa nos gestos lancinantes e nas lágrimas que espalha em seu redor.
Nada a consegue travar e todas as batalhas que enfrenta são vitórias a enumerar....
A saudade é imponente...tem um nariz arrebitado que não torce a qualquer cara feia que lhe surge pela frente. Não se comove com choros a horas adiantadas, nem tão pouco se compadece com os gemidos de dor de um coração destroçado. É implacável no momento de brilhar e brilha como ninguém quando sapateia em cima dos teus sonhos. Até tu te ajoelhas quando a vês assim tão magnifica...confessa!!
Na saudade cabe um mundo inteiro porque o seu corpo alonga-se com o tempo e a cada minuto que passa outro solitário a ela chega sem esperanças de lá sair. O mar conhece-a bem, porque já viu tantas mulheres amarguradas e tantos homens desiludidos nas suas ondas a desfalecer por ela. O sal que ele guarda nas marés ainda tem o odor das suas lágrimas e todos lhe confessaram que vinham ali chorar por ela.
Que não queriam mais sentir a sua ausência a devorar-lhes a carne e soluçavam arrependidos por nunca terem acreditado nos boatos que reclamavam a sua existência. Tinham ouvido histórias de uma musa que encantava os apaixonados com promessas de eternidade e de felicidade sem fim...e tolos amaram-se sem limites até que o sonho fosse só fumo. Porque haveriam de ter medo da saudade? De uma beleza sem par...de um sentimento perturbador e duradouro? A emoção que não seria senti-lo a remoer nas suas entranhas... porquê ter medo se podiam dar as mãos ao outro e sentir que a saída era mesmo ali ao lado?
Não havia razões para temer a saudade, só vontade de a possuir com loucura...
E a saudade é uma dama que não se faz rogada a nenhum convite meloso e em pouco tempo é certo que te abraça o corpo com mil e um braços de ferro forjado....quando dás por ti já não tens forças para dela te libertares. Então conheces de perto o perfume da dor, o som dos ponteiros do relógio que rangem como portas velhas, o teu desenho ao espelho que juras estar distorcido porque o teu rosto parece inchado de tanto chorares, até esqueces a cor do sol e afirmas que ele hoje não é amarelo e inventas um novo tom de cinzento só para não te chamarem de mentiroso por dizeres que ele te faz sentir frio quando vais á janela.
Mas tu sabes que ele não te consegue aquecer por mais que te deites debaixo dele todos os dias...
Depois dizem-te que as saudades passam se pensares noutra coisa... e tu pensas... pensas... e imaginas um jardim cheio de flores em plena Primavera e até parece que sorris de novo, mas quando começas a esboçar um sorriso as flores murcham de repente e o céu enche-se outra vez de nuvens e ameaça chover na tua cabeça porque as nuvens que nela pairam são tão negras e feias. E tu então, foges dali...corres sem cessar para lado nenhum o que te importa mesmo é fugir. Fechas os olhos, respiras fundo porque parece que adivinhas que ainda tens um longo caminho a percorrer e tentas novamente pensar em coisas boas e abandonar a maldita saudade. Esqueces as imagens e concentras-te nos sons à tua volta...carregas o silêncio no teu leitor de cds e aguardas que a música comece a tocar. É claro que esperas ouvir algo novo, um som harmonioso e calmo mas que te encha de boas vibrações... já concentrado ficas à escuta e realmente ouves ao fundo uma melodia quase imperceptível mas por momentos tens a vaga sensação que ela te é conhecida. Sentes que os teus olhos tremem ao ouvir cada nota e o teu coração parece que enfraquece no teu peito... aquela música ..”foi com aquela música que nós ...”e tu bem tentas acabar a frase mas já não consegues porque irrompes num pranto e as tuas palavras já não são mais que soluços. Foi o regresso da saudade que sentiste ali...mas por favor não desistas que um dia ainda lhe vais dizer adeus para sempre...
Daniela Pereira-25 /12/06