Por um sorriso .
As coisas inúteis partiram... Não
disseram adeus. Fizeram as malas e partiram. Não partiram a sorrir,
simplesmente enfiaram os tempos e os momentos numa mala e foram pelo
teu coração acima.
Sem nada dizer...sem nada fazer. As
coisas inúteis partiram.
E tu que sonhavas ter uma casa...não,
duas casas...três...quatro. Todas as casas que fossem necessárias
para alojar os teus amigos. Os que já partiram porque o destino os
levou. Os que não quiseram ficar. Os que ainda cá estão. E tu que
sonhavas ter uma casa...não, duas ou três... todas as que tivessem
espaço para os albergar. Ias desenterrar os mortos, as memórias
mais podres e feias, ias lavar a cara, sacudir o pó e dar-lhes
flores. As flores mais belas e luminosas que pudesses semear em ti.
Ias desenterrar os mortos e cuidar deles, mesmo quando precisasses de
cuidar mais de ti.
Já os vês sentados no sofá, sorrindo
para ti outra vez e tu a sorrir de volta.
Os amigos que partiram... aqueles que
cruzaram oceanos, que foram correr a vida para terras distantes. Os
que partiram carrancudos e sem remorsos... os que viajaram com o
coração saudoso...os que ainda te lembram e te recordam na
melancolia dos dias como uma folha de um livro que dá prazer rever.
As coisas inúteis partiram. Algumas
fazem doer por dentro. Não dói sempre...é só de vez em quando.
Aquela dor fininha, como uma picada e fechamos os olhos esperando
que logo passe. Mas outras coisas inúteis magoam a valer, ficam
feridas que incomodam, que nos desencantam. Mas até essas por perto
queríamos de novo ter. Aquele masoquismo saudoso que só as coisas
inúteis em nós sabem promover.
E nós com as casas de portas abertas,
sempre abertas... Deixamos entrar o vento, o frio.. morremos com as
correntes de ar. Mas nunca fechamos as portas... bater com a porta, é
forte. Ganhamos doenças, latejamos dores de cabeça, mas abrimos as
portas. Sonhamos que é possível...e construímos casas e casas e
deixamos as portas abertas. Novamente abertas... E se fosse realmente
possível? E se abrir as portas e deixar entrar fosse a solução de
todos os nossos problemas? Mataríamos a dor, sem que ela sequer
estivesse à espera. E os amigos que partiram, os amores que
deixaram de ser, as paixões que perderam a chama..tudo ali de novo à
tua porta, sorrindo e pedindo para entrar. E entravam. Sentavam os
corpos e as memórias , ali bem ao teu lado. Sem dor, sem
ressentimentos, sem amarguras...estavam nus de prantos. Límpidos,
transparentes como gotas de água para matar a tua sede. E tu
recebias no teu coração todos... todos e o teu coração
continuava largo com tanto espaço para preencher e tu rias, rias e
eles riam contigo. Davam gargalhadas bem alto, abraçavam-te com
força e tu sorrias e dizias as coisas mais profundas sem abrires a
tua boca. Falavas com o olhar e o teu olhar tinha todas as cores. Nos
teus olhos, os astrónomos descobriam perplexos o habitat de novas e
desconhecidas estrelas e tu rias. Coravas e dizias que os teus olhos
são tão normais...e as coisas inúteis sacudiam a cabeça num gesto
de reprovação. E tu ficavas tão admirada, tão repleta de prazeres
dentro de ti que até a tua pele rejuvenescia. E as coisas inúteis
que tanto amavas continuavam a entrar e perguntavam por ti. Então
como estás? ...e tu abrias os braços com a amplitude maior do teu
ser e abraçavas..abraçavas até ficares com os braços tontos. As
coisas inúteis gostavam de ser úteis em ti outra vez.
Daniela G. Pereira
Direitos de Autor Reservados
P.S: G* T* P* R*
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