domingo, junho 18, 2006

Sussurros e poesia-Parte III-Respirar num gesto pensado




Inspiro fundo...
E porque já não respirava à tanto tempo
deixo que os meus pulmões
recordem lentamente o gesto.
Sem pressas
deixo o ar suspenso
e não lhe apresso a viagem.
Ouço o mar
ofegando nas paredes do meu quarto
e em silêncio
absorvo o cheiro da maresia impregnado nos lençóis.
A pele fica roxa
enquanto aprisiono o ar
e mesmo que sufoque
sei que não desistirei de dominar
este corpo que é só meu
por uma herança
que a alma deixou na carne.

Sinto que perco as forças
e a vertigem
é um acto pensado
nesta libertação forçada da mente.
Os olhos fecham-se
e o mundo são imagens desfocadas à minha volta
sem rostos cerrados
nem rugas nas palavras
porque o silêncio não envelhece...

Passaram apenas alguns minutos desde aquele momento em que decidi respirar profundamente ao sabor da poesia. Agora que prendi por momentos as palavras com cordas pretas e as esmaguei contra paredes brancas, sinto que chegou a hora de as deixar soltar o ar calmamente enquanto caminham por estas longas linhas sem a poesia pesando nas costas.
Posso então abrir os olhos descontraída e ver que o meu mundo ainda está perfeito mesmo que nunca deixe de ter recantos imperfeitos à primeira vista.
Inspiro...e expiro devagar
E ao sabor desta loucura que é respirar começo-me a sentir como se fosse apenas mais uma onda que o mar alberga nos seus braços numa sintonia perfeita com a natureza. Mas como nada é eternamente perfeito dou por mim a rebentar ilusões contra um muro de areia improvisado à beira mar.
Então dou uma abanadela ao meu corpo para que saia daquele transe e regresso ao sufocar da vida...

Daniela Pereira-18/06/06

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