quarta-feira, junho 23, 2010

O fim de todas as coisas maduras...




Escrevo-me...

Serei um drama em cada folha adormecida no colo dos leitores que me vigiam por detrás de tantas letras tristes e marcadas no papel?
Um conto cinzento que não sei colorir por ter perdido dentro de mim toda a cor?
Sempre me senti um romance mas quebrei-me em mil poesias todas as noites em que amei com o coração aberto e no entanto em nada fiz-me poema...só fui devaneio de uma cama que não se queria ver vazia.
Tive perfumes na pele..tive sonhos..beijos dados com paixão..tive promessas...não...não tive promessas,tive instantes...pedaços de tempo que corriam como cobras sem pernas por isso nunca tocavam o chão quando me percorriam.Eu pensei erradamente que galopavam o tempo porque tinham asas..ignorância súbita de quem se orgulha de saber pensar e de ter no pensamento uma esperança segura.

Escrevo-me...

Destapo-me dos pontos finais que me foram dados...das intermitências nos sentimentos que só a ruas escuras me conduziram..e os passos que eram tão firmes para mim eram pressentimentos de um andar enterrado em areias movediças de onde nunca mais poderei sair.
Interrogo-me...faço questões que o mundo inteiro não compreende e simplifica com pena e eu retribuo sentindo-me mais complexa porque já nem as respostas me satisfazem...nada é credível..porque tudo passa rápido demais para ser palpável com as mãos..até os abraços são de fumo,escassos e voláteis...formas que não prendem só sustentam a alma quando ela está prestes a cair mais fundo.Ainda vês o mar aí desse buraco? Sentes a brisa pelo menos e nadas sem te molhares...só os teus olhos atravessam as ondas com a intenção de as quebrar...o resto do teu corpo fica parado exposto às ambições de alguém sem rosto.

Escrevo-me...e o amor escreve-te em reticências amarguradas que não terminam no fim das margens,és um romance inacabado com capas negras ao ombro onde o sol está prestes a morrer em todas as páginas...mas por milagre sobrevive com os pedaços de luz que na escuridão encontra.

Escrevo-me....Sou o fim de todas as coisas maduras...
Folha verde...

Daniela Pereira
Direitos de autor reservados

segunda-feira, junho 21, 2010

Intersticios e um punhado de vento

Choveu de noite e eu não dei pela chuva a cair...
Eras leve demais naquela gota de açúcar para seres tão doce
e hoje para ter um dia com mais sol
pinto-te as sombras e os interstícios da razão
como se o vazio de alguém pudesse ser mais um quadro na parede pronto a pendurar.

Houve arco-íris de rua e no céu alguém teceu tapetes em linho verde para receber o sol de braços abertos...como se a luz de um dia fosse uma festa...um festival de brilhos e utopias...mas mesmo assim choveu de noite.
Posso dizer que as memórias são feitas de orvalho mas tinha que ter a mente mais fresca e os olhos mais secos para lhe compreender a textura como algo que passa num segundo...porque a chuva passa e o Verão até anda por perto a prender-me o vestido num vento discreto e a queimar-me os seios com desventuras.

Choveu de noite...pode também ter chovido de dia...importa é que não a senti minha,mas sim como um instante de tempo molhado que nada mais promete para além de um coração hidratado e já sem dor.

Daniela Pereira
Direitos de Autor Reservados

sábado, junho 05, 2010

Matinal e uma gota de fruta...


Enquanto a chuva vier..hão-de vir os pardais matar a sede no lago das lembranças e comer-te a mente ainda doce e fresca como se fosses o último fruto maduro ainda apetecível no jardim....


Daniela Pereira
Direitos de autor reservados

terça-feira, junho 01, 2010

Memória cheia...


A memória é um bicho estranho difícil de domar....
venham as borboletas e os rouxinóis...
que partam os corvos e as moscas pretas dos coloridos anzóis...


Enfrento a problemática do síndrome de memória cheia de pensamentos vestidos de branco a caminhar certeiros em direcção a um buraco negro esculpido a rigor...
Já passei a passadeira vermelha..hoje toda a memória é lenta quando foca um qualquer momento...
Pobre memória,tão cheia de pudor e de panos quentes nas feridas....tão bela que és quando corres como um rio sem medo de entupir os teus belos olhos nas pedras desse leito comprimido que trazes no coração...

Texto e foto de Daniela Pereira
Direitos de Autor Reservados