segunda-feira, março 28, 2005

Beber as lágrimas

.
Fogem-me lágrimas inquietas dos olhos cansados
escorrem pelo rosto numa suavidade ácida
corroendo a pele macia.
Molham o vidro do relógio parado
afogando a poeira depositada nos ponteiros
encharcando o tempo insosso.
Leio novamente os versos escritos
e numa monotonia avassaladora
vou arrasando pensamentos com turbilhões nascidos na mente.
Nas notas de cada balada ouvida
gotas salgadas abraçadas aos sorrisos discretos
dançam numa valsa giratória
até caírem tontas no chão de papel.
Queria matar esta dor que me consome lentamente a alma...
Queria secar esta fonte que corre nos meus olhos ...
Fogem-me as lágrimas dos olhos
e eu não as consigo beber com os lábios gretados .

terça-feira, março 22, 2005

Beijos agrafados


Como eu queria que as palavras
tivessem beijos agrafados na língua.
Seria mais fácil exprimir o que sinto
sem ser preciso tocar nesses lábios.
E se as lágrimas tivessem espelhos
em cada gota que cai?
Então seria transparente aos teus olhos a dor do meu rosto.
Não sei perfumar pensamentos...
Nem saberia que aroma escolher
para este mundo de emoções onde transbordo.
Tenho momentos...mas não são mais do que isso...momentos...
Em que sinto vontade
de arrancar todos os versos
como se eles fossem espinhos
e o meu peito a rosa onde eles estão cravados.
Mas depois olho para eles só mais uma vez
e aos meus olhos eles já não são mais espinhos...
São lindas pétalas azuis que coloram a minha breve negritude.
Então fico tonta a contemplar a sua beleza
e esqueço as feridas que eles rasgam na pele
e esqueço as lágrimas que neles choro .
Quando o poema chega ao fim
eu só tenho olhos para o sorriso doce
que saboreei nos beijos de papel
e esqueço tudo o que sonhei com a folha ainda em branco.

sábado, março 19, 2005

Naufrágio a dois


Mergulha no meu mar bravio
e rasga as minhas ondas
com as tuas mãos salgadas.
Despe a minha pele na areia molhada
e lentamente faz do meu corpo uma maré vaza.

Deixa os meus pedaços
espalhados nas dunas
e enlaça a tua boca de água
nos meus lábios de algas vermelhas.

Sente a tempestade desbastando a tua língua
num turbilhão de sensações
e ouve as rochas gritando os nossos nomes
enquanto os nossos corpos ondulam excitados.

Escuta o silêncio cantando para nós
murmurando baixinho em sintonia com as gaivotas
que sobrevoam as nossas cabeças
esperando os restos despojados desta loucura.

E quando a primeira estrela
desenhar o seu brilho no céu de prata
naufraga a tua alma na segurança do meu peito e adormece.