sábado, fevereiro 27, 2010

Insólitos Descartáveis I

Insólitos Descartáveis- Excerto do texto "Somos cães que as larvas desprezam"






Não quero ser arrogante nas palavras que exalo, mas a arrogância aqui faz todo o sentido. Estou a olhar o mundo que está lá fora e sinto nojo por senti-lo assim....bruto e grotesco. As pessoas parecem uma matilha de cães esfomeados lutando pelo melhor pedaço que a vida lhes atira ao chão.. e como cães que são mostram-se bichos rudes e insensíveis não hesitando em morder os fracos e derrotados até ficarem com os dentes bem cravados na carne... porque neste mundo só os vencedores merecem comer. Vale tudo para se ser feliz neste planeta de mesquinhez e cobardia! Queres ser feliz ? Então, não penses mais porque a maneira mais fácil de lá chegares é devorares a felicidade dos outros...engole-a só para ti...tira-lhe o ar e depois deixa-a seca e vazia num canto qualquer da tua rua. De preferência, num canto escuro, só para que ninguém veja o teu trabalho sujo a brilhar na sujeira que amontoas na tua alma. Não podes ser descuidado e deixar á mostra de todos, as lágrimas daqueles que espezinhaste porque ainda rompes a tua máscara e toda a gente vai saber que és um monstro horrendo. Montaste ao meu coração um cenário lindo de morrer! Só podia porque no fim ele será o meu cemitério ...e a morte de um sentimento tem que ser celebrada com euforia e cor. Fico a rir dos teus rios límpidos e cristalinos, onde a água é na tua dimensão imaginária um objecto de pureza extrema. Achas que não consigo ver que ela está conspurcada de restos maltratados? Louco e inocente...é isso que és! Tenho olhos de breu, mas ainda consigo ver para lá da mentira porque a verdade nunca me enganou e sabe bem guiar os meus passos. Iludiste-me... enfeitiçaste-me com palavras doces e lenga-lengas, mas o meu peito sempre desconfiou dessa doçura reforçada. Batia mais forte...é certo que batia! Mas em todas as corridas que fazemos o coração acelera mesmo que tu vás direito a um precipício ...ele não pára. Não escolhe porque bate...apenas sente debaixo de um emaranhado de músculos entalados na carne e abraçados por sangue que tão depressa ferve como congela a uma velocidade estonteante.
O mundo gosta de pregar sermões aos peixes... de cuspir amabilidades e falsas certezas pela simplicidade do acto. Ser sincero é muito mais trabalhoso! Custa sofrer quando se diz uma verdade e ela é sentida até à raiz dos teus cabelos....imagina-a como uma dor dentes...

Daniela Pereira in Afectos Obsessivos (Excerto do texto “Somos cães que as larvas desprezam”),Edições Ecopy 2007

quinta-feira, fevereiro 25, 2010

Aproximações


Todas as recordações guardam perfumes e gotas de sal em frascos de vidro fosco..Todos os teus passos têm cheiro a passado..gosto a presente e gestos para memória futura...O resto..o que não nos marca...o vento sopra como folhas castanhas que o Outono desprezou




E quando dançamos...dançam aos nossos pés todas as estrelas caídas na maré dos nossos sonhos...E todos os jardins ganham cor nos amontoados de terra que ninguém quis florir...Já tens margaridas brancas penduradas nos cabelos e nos teus lábios rosas de carmim ganham mais carne...Mas quando dançamos a tua alma é fresca brisa que me arrefece até aos ossos..


Daniela Pereira
Direitos de Autor Reservados


segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Afago ...


E
nos teus olhos vi o sol poisar aos pés da lua todos os teus segredos...
as tuas viagens nocturnas pelos telhados e as marcas das tuas passagens
gentis.. Afago-te...já não pareces cansada mas apesar de tudo...ainda
descansas


Daniela Pereira

quarta-feira, fevereiro 03, 2010

Quando uma chama respira na tua boca..morre uma cinza nos teus cabelos..


Vamos celebrar as palavras como quem festeja os anos que passam..
Os anos que correm nas tuas veias,apenas se virares o mundo de pernas para o ar...
Se não, o chão pára a ver-te silenciar o coração
como se tu fosses uma rosa sem espinhos
que o vento não perdoa...

Vamos dizer que estás vivo..
Que a água que te molha os pés e te faz espirrar
já foi um rio num dia que passou
na folha escrita do teu calendário...
Sei de fonte segura que te rasgaram algumas vezes...mas tu não te fizeste página rasgada e rasuraste as tuas feridas mais profundas lambendo o mel que te colou..
E morreram os teus amargos de boca
esmagados pelo peso daqueles dedos que gritavam...
LIBERDADE

E se as palavras te disserem...
Sentes medo ?

Tu vestes um sorriso..
como quem veste a pele de um filho acabado de nascer
e com todas as tuas forças
proteges a tua boca de todos os frios de Inverno
que já viste em ti mil vezes renascer...
Depois ficas sossegada no teu mundo
a desenhar luas no tecto
e a tatuar estrelas nos tornozelos
à espera que peixes dourados
vejam em ti uma onda de água doce
reflectida num espelho...
Não te partes...
Queres-te inteira
a saborear os mergulhos
e já não és mais um resto de ser...
És borboleta que desponta ao pôr-do-sol..
És orvalho com folhas por beijar...
És castiçal de luz e a escuridão já não te vela...

"Se as tuas palavras estão vivas
e o teu coração bate tão depressa no respirar de cada uma delas..
então menina dos olhos de terra
tu só podes ser alegremente
um belo poema imortal..."


Daniela Pereira
Direitos Reservados