Todos os dias escrevo um poema...
Hoje foi mais um dia no calendário
com as palavras a servirem a gula dos meses.
Mas eu também respiro todos os dias e o meu coração neles também bate...
Usar a poesia no canto da boca,
não a torna num gesto mais especial...
é só mais um, no meio de outros tantos
que me empurram para fora de mim.
Talvez eu devesse, plantar um limoeiro no jardim
ou semear tulipas , para colher no meu peito um ramo massivo de flores.
Talvez eu devesse,salvar o mundo da pobreza
e regar as barragens para lhes matar a seca.
Mas não... todos os dias escrevo um poema...
Como se a poesia pudesse matar a fome ou salvar a solidão do mundo...
Podia esculpir o gelo, como se fosse uma delicada e sensível artista...
Fazer nascer corpos nús e formas desconexadas
para confundir e maravilhar as almas.
Podia , mas não o faço, porque só nas palavras me encontro imperfeita e desconstruída...
Pronta a renascer em cada parágrafo.
Todos os dias escrevo a porra de um poema...
Todos...Nem sequer escolho os dias pares ou os impares ...
Podia fazer uma distinção, para organizar por cores as ideias.
Talvez eu devesse; governar o mundo com as minhas próprias mãos
Envergar a bandeira da democracia, quando jorro de mim sentimento,
Como se ele fosse o sangue dos meus erros e omissões.
Podia entender todos os seres e abraçá-los como se fossemos todos irmãos...
Talvez eu devesse,ouvir as mentes caladas e escutar-lhes os silêncios
como canções de embalar que se murmuram baixinho
Para não acordar ressentimentos e iras.
Mas não, todos os dias venho até ti...
Pálida e entristecida, libertar os meus lamentos num parco verso.
Pudesse o mundo inteiro, entender o teu coração
Como tu entendes as reticências que ficam suspensas
depois de sentida no peito
a incerteza do ponto final de uma dor.
Sem comentários:
Enviar um comentário