domingo, agosto 02, 2009

Às Horas mortas...






à meia noite e trinta e sete a caneta escrevia um ponto final...

Hoje queria adormecer sem dar tempo para os pensamentos se instalarem. Gosto de lhes retirar todas as almofadas e encostos, na esperança que façam cama noutro recanto...bem longe do meu parapeito.
É para lutar outra vez? Para ir inventando um ou outro sorriso no vão da escada...Então invento um chão que me suporte o peso ao cair. Tudo para sofrer com o corpo mais leve...
Tenho uma rosa vermelha no coração...desfolhada por um belo milho rei e canto lindas cantigas com os dedos em arco e um rouxinol engripado na barriga. Sou rainha e o meu trono é decorado com letras azuis e versos brancos.
Queria dizer que amanhã vou saltar para outro lado onde os mortos renascem ,mas estranhamente sinto-me bem aqui...nesta realidade tão distinta dos meus sonhos.
Fiz bem em aterrar nesta montanha, para não ter que pedir ajuda quando quiser subir outro coração que se diga gigante ...
Já cá estou no alto...fitando o mundo tão pequeno a sorrir a preços bem baratos lá em baixo..é educado sorrir mesmo que no teu peito rebentem prantos...
Não me apetece sorrir..posso passar o meu sorriso para aquela alma que está ali ao lado,só para não me esquecer como se faz? Posso?..
E um grito..posso dar?
Daqueles gritos que nos arrancam os restos cravados a jeito e nos elucidam a mente quando se calam..
Expurgar os fogos que nos consomem por dentro com um par de lágrimas bem dado...
Tens razão devia pular como os macacos entre as revoltas e impotências que me cercam os ramos verdes no olhar...
Podia também traçar um projecto de fuga à incompetência sentimental atribuída à dor, realçando todas as linhas por onde caminhei à beira da estrada e onde fui atropelada ao primeiro passo em falso..e lá fiquei abandonada na berma com os sentidos desencontrados.
Igualar a estupidez de um silêncio à dureza de uma palavra libertada quando o mundo nos parece querer irremediavelmente fugir e a querer lhe dizer insistentemente .."Não fujas daqui!"
Não adormeci...tenho medo do amanhã, mas cruelmente ainda respiro...
Dar um murro na mesa por vezes não faz o coração parar e eu gosto quando sei que o meu ainda bate...
Estender a mão , não é promessa de receber outra mão apertada na volta..podemos receber um laço apertado ao pescoço ou regressar com a mão ainda mais vazia e sufocar de admiração... A lei da Vida teima em ser assim... distorcida..
Não vais chorar mesmo que os teus olhos implorem esse direito a uma descarga emocional de joelhos! És mais forte que todos os mares onde já te afogaste..tens a prova vida nos teus dedos que ainda estão secos e nas palavras que mesmo húmidas não param de jorrar alheias à tua mão que já se queixa dormente...
Mais um minuto acordada e conheces-te mais um pouco..vale a pena aldrabar o cansaço.
Vais fechar os olhos à tua luz,só porque a noite a razão em ti quer cegar?
És um padrão amargo no tecido mas és tão doce no rasgar...


Daniela Pereira in Às horas mortas
Direitos Reservados

3 comentários:

Sara Fidiró disse...

Que bonito este post Daniela! Bjs

blueiela disse...

Olá Sara:)

Bom ver-te aqui..obrigado pelo comentário;)
Quando o sono custa a chegar eu vingo-me no papel e dá nisto...escrevo até sentir que os meus olhos merecem fechar...

Grande beijinho para ti

blue

Luís Miguel disse...

não passes o teu sorriso a ninguém ao lado

fica com ele na tua boca

(mas com uma curva ascendente)